Adolescente até quando?
Entrevista ao Jornal Metro | 04 de abril/2014
Por: Andrea Morganti com colaboração de Natália Vidal e Valéria Lisondo
ENTREVISTA NA ÍNTEGRA
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(Jornal Metro) O que é adolescência estendida? Como identificá-la? Quer dizer, quais as principais características e situações que a definem?
(Andrea) É um fenômeno bastante observável nesse momento atual, e diz principalmente de uma postura, por parte do jovem, em não se apoderar ativamente em prol de sua autonomia, tendo dificuldade em fazer e sustentar projetos consistentes a longo prazo, seja na ordem profissional, no afetivo, ou social. Um certa ‘desresponsabilização’ dos atos, dentro de um contexto onde os pilares de valores estão sendo questionados. Ao mesmo tempo, observa-se uma conivência por parte dos pais, em mantê-los nesse lugar.
Esses jovens sofrem na ambivalência constante de ora se sentirem muito potentes e poderosos, por outro, escondem um lado absolutamente frágil e inseguros de si.
A exemplo, o motorista de 22 anos que há 1 ano atropelou um ciclista, deixando-o amputado. Independente da reação posterior, a imediata reação do condutor foi a de jogar o membro (braço) no rio.
(Jornal Metro) É possível definirmos o perfil do jovem que vive esse fenômeno? (urbano x rural; classe social; limite de idade; escolaridade; genero; etc)
(Andrea) Fica difícil definirmos o perfil desses jovens em áreas rurais, cujas responsabilidades permeiam outros valores e outros códigos sociais. Nos centros urbanos ocidentais esse fenômeno é mais facilmente identificado. Talvez pelo imperativo da sobrevivência enquanto sustento financeiro, essa situação possa ser mais sustentada em famílias em melhores condições financeiras, permitindo o ‘alargamento’ da então denominada fase de passagem (como se costuma chamar a adolescência)
(Jornal Metro) Porque esse fenômeno está acontecendo hoje em dia? Quais os fatores existentes e os cenários construídos para que pais e jovens prolonguem a adolescência?
(Andrea) O que acontece é um rastro histórico datado lá no fim do sec. XIX, quando iniciou um questionamento sobre os modos de se fazer ciência, abalando as bases da verdade absoluta e inquestionável. As verdades admitidas até então passaram a ser questionadas. Arrastando esses abalos para as instituições que definiam valores na nossa sociedade. Há um questionamento e revisão do que significa instituições pilares como família (homem-mulher, união homoafetiva, filhos, idade média do casaento), religião, estilo de vida saudável X estresse; respeito a individualidade X ter que atender as expectativas do mercado; produzir resultados sem perder a singularidade e a sensibilidade própria do ser humano. As ofertas e opções do que se pode ser em dia são um leque sem fim. Há muitas profissões, há muitas possibilidades, há um vasto estilo de vida e carreira a se seguir, há diversas formas de se explorar a sexualidade (não que não existisse antes, mas atualmente é mais ‘permitido’).
(Jornal Metro) A adolescência estendida é saudável? Ou trata-se de uma falha dos pais, que querem manter os filhos sob sua proteção ao invés de estimularem a independência deles, e um oportunismo dos filhos, que preferem a comodidade da roupa lavada e o dinheiro fácil ao invés de procurarem "se virar"?
(Andrea) Entendo que este é um fenômeno que causa impactos sociais e pessoais (os jovens nessa situação, apesar de se dizerem disfrutando a liberdade, geralmente enfrentam grande sofrimento e solidão) Não se trata de distribuir culpas.
Também é importante grifar que tal fenômeno responde a um valor simbólico impregnado de modo mais generalizado e sutil na sociedade. Com isso quero expressar que seria equivocado analisar esse comportamento considerando apenas a díade pais-filhos. Por exemplo: ao atentarmos para as mensagens comumente veiculadas em anúncios publicitários das mais variadas formas há o imperativo de mostrar algo na linha de que ser jovem , ‘despreendido’ / inconsequente é algo `bacana’ e poderoso.
(Jornal Metro) O que os pais devem fazer para evitar que a adolescência dos filhos se estenda? Como quando eles permanecem em casa até cerca de 30 anos... 5.1 E como eles devem agir se perceberem que estão vivendo o fenômeno?
(Andrea) Em primeiro lugar gostaria de esclarecer que uma pessoa com cerca de 30 anos que ainda viva na casa dos pais não necessariamente se enquadra no conceito que chamamos de adolescência estendida. Trata-se muito mais de uma postura diante das relações e da vida, que um dado efetivo concreto.
O que eu diria aos pais é que fiquem atentos a sua parcela de responsabilidade na manutenção desse quadro. Por mais que aleguem que essa situação lhes é incomoda, pode ser que usufruam os filhos por perto – e com isso terem de evitar outras questões tais quais o próprio envelhecimento, por exemplo. A ambivalência* (o querer e não querer) em geral também é uma tônicaconstantee armadilha para os progenitores. Impõe limites para mudar a situação, sentem-se culpados e cedem novamente, catalisando um continuum sem fim e sem propósito.
Os pais devem estar se dispor para o efetivo desenvolvimento e amadurecimento dos seus filhos. sem sofrimento nem sempre há crescimento. Assim como algumas plantas, é preciso podar para ela poder crescer.
(Jornal Metro) Como a psicologia define "adolescência"? Trata-se de uma fase passageira entre infância e a vida adulta? É um rito de passagem?
(Andrea) A adolescência é um conceito que foi construído socialmente. Na idade média isso não existia, por exemplo. Grosso modo, podemos dizer que é a passagem da fase da infância para a adulta. É quando os valores adquiridos e herdados dos pais/familiares são questionados e revistos para então adotarem àqueles que lhe fazem sentido